julho 09, 2016

“Na Minha Morte” (1930)

"Na minha morte enterrem-me na minha terra natal do Mississipi", este é o motivo central de que deriva toda a ação, conduzindo-nos numa travessia dura e austera junto dos filhos e marido. Faulkner é aqui Faulkner, com um registo próximo de “O Som e a Fúria” (1929), evoluindo o experimentalismo, nomeadamente pelo minimalismo que desenvolve a partir de uma forma particular de contar histórias e que se serve de relatos entrecortados de vários narradores (15), o que obriga o leitor a construir o todo a partir dos interstícios que ligam os discursos de cada um desses narradores.


Em termos pessoais, por várias vezes viajei até às minhas memórias de “Silent Souls” (2010) de Aleksey Fedorchenko, um filme em que o marido atravessa um território vasto da Rússia para cremar a sua mulher num rio, seguindo as tradições de um povo quase desaparecido. Já no campo da austeridade e do vazio dos cenários não me consegui desligar das deambulações entre terras que decorrem ao longo das 7 horas de “Santantango” (1994) de Bela Tarr.

Faulkner, como muitos outros escritores, apesar de todo o sucesso não pôde dedicar-se em exclusivo à escrita, mesmo depois de “O Som e a Fúria”. “Na Minha Morte” foi escrito enquanto fazia o turno da noite numa estação de energia da Universidade do Mississipi, entre a meia-noite e as quatro da manhã, ao longo de seis semanas, Faulkner diria ainda que tal como escreveu assim ficou, sem qualquer edição. Admire-se a proeza, mas o facto de se tratar de uma obra experimental torna mais fácil não se sentir tentado voltar atrás mexer e remexer até ficar perfeito, além de que Faulkner precisava do dinheiro dos editores para viver.

Em termos comparativos, não posso colocar este texto ao nível de “O Som e a Fúria”, não pela dimensão mas pela imensidão de mundo, de variação emocional e estética conseguida nessa sua obra-prima. O que não faz deste menos, é um belíssimo texto, uma viagem forte que se impregna em nós, mas que deve ser visto mais como experimento, uma tentativa de elevar o seu labor a novas dimensões literárias, sofrendo, para mim, de alguma incompletude.

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