dezembro 21, 2009

Free, o custo zero do digital

Chris Anderson é director da famosa revista de novas tecnologias, Wired e autor de um livro de grande influência na área, The Long Tail: Why the Future of Business Is Selling Less of More (2006). O que nos traz agora é algo na senda da Cauda Longa mas mais específico sobre o funcionamento dos mercados criativos nos tempos digitais, um livro sobre o aspecto da gratuitidade da informação (bits) online chamado Free (2009). Aliás para comprovar esse aspecto de gratuitidade Chris Anderson disponibiliza no seu site, Long Tail, não apenas o livro integral, mas também o audiobook integral e gravado por si.

O livro está escrito de forma muito escorreita, e o modo como Anderson realiza a leitura dá-lhe ainda maior fluidez. Anderson junta nas menos de 300 páginas vários exemplos que demonstra o poder da gratuitidade e explica como esses modelos estão já hoje em vigor nos mercados físicos. Dando exemplos como a guerra entre o Jornal de Notícias e o Público no que toca a oferta de objectos que valem mais do que os próprios jornais, funcionando como seguros de leitura e logo de retorno publicitário. Exemplifica ainda com a Ryanair e os seus voos a custo zero, pagos por outros meios, como hotéis, autocarros, aeroportos que pagam comissões.

Sobre a indústria digital o que nos diz é que esta funciona sobre parâmetros muito distintos dos mundos físicos e que a importação directa de modelos de negócio de um mundo para o outro não podem funcionar segundo as mesmas ideias. Por exemplo no caso do seu livro disponibilizado gratuitamente, Anderson refere que espera ser pago por via dos convites para falar sobre o próprio livro e as suas ideias. O livro gratuito funciona assim como ferramenta de promoção do seu saber. Quanto à música a lógica oferecida é idêntica, os músicos devem centrar-se no que sempre souberam fazer, tocar música, e ganhar dinheiro com isso, não esperar pelas receitas de algo que deve servir de modo promocional. Por outro lado encontrar novas formas de ganhar com a publicidade, ou ganhar com o facto de se ter um mercado global. O mercado global abre hipóteses para que poucos paguem o que muitos consomem através do chamado modelo Freemium.

Aliás sobre este assunto argui recentemente um tese de mestrado de Daniel Quintã no qual ele opera a problemática a partir da análise do aparecimento dos modelos de registo fonográficos. Foram esses registos que criaram a indústria de marketing à volta da música e é essa a indústria que está a sofrer. A música continua de boa saúde e recomenda-se. Cada vez mais concertos, cada vez mais músicos, cada vez mais pessoas interessadas em música. Mas se no início do passado século só se tinha acesso à mesma por via de um transístor de rádio, agora temos um acesso via internet em modo interactivo, podendo escolher o autor, o álbum, a faixa, e número de vezes que queremos ouvir. Faz parte de um processo evolutivo natural do registo sonoro. Aliás como sempre, todo e qualquer media que trouxe evolução foi visto pelo aparelho acomodado como algo representativo do fim, algo apocalíptico para os criadores, para os consumidores, para toda a sociedade.

Claro que este não é um posicionamento fácil, apesar da grande comunidade online estar de acordo ainda recentemente o Parlamento Europeu aprovou mais algumas medidas escandalosas de protecção dos interesses instalados, permitindo que o acesso à internet possa ser cortado sem ordem judicial por reincidência de downloads chamados "ilegais" (nota: Portugal não ratificou essa lei e por isso não se aplica no nosso território). Aliás o livro de Anderson não fica sem críticas directas de Malcolm Gladwell que na New Yorker não deixa de atacar o livro e todo o seu conceito. Lembro que ainda recentemente quando Chris Anderson foi entrevistado por Carlos Vaz Marques, houve várias reacções na comunidade portuguesa fonográfica, desfazendo Anderson e todo o seu quociente de inteligência.

Para um primeiro contacto com as ideias do livro leia-se o artigo de Anderson sobre o tema na Wired.

PS: a edição aqui analisada foi o unabridged audiobook de 2009.

1 comentário:

  1. "Home Taping is Killing Music... and it is illegal!"

    Ainda este mês o editorial da Blitz dizia que o facto de hoje em dia não aparecerem novas GRANDES bandas, como antigamente, se deve à descapitalização das grandes empresas da indústria. E o culpado, é o download ilegal. Por outro lado, não sei se ter uns super hypados Beattles ou afins, é algo que faça falta à música, e a quem a ouve. Será que ter mais quantidade, com investimentos menores (mais divididos), trará melhores frutos?

    Estes novos desafios que se põem à música são acima de tudo assustadores para quem vive dela e está habituado os modelos do século passado. O que compreendo.

    Uma questão interessante poder-se-ia por com os videojogos. Se todas as consolas e jogos fossem tão facilmente acedidos/sacados/usados ilegalmente, o que aconteceria à indústria? Se no campo da música já existem muitas soluções alternativas para capitalizar, no mundo dos videojogos os artistas iam fazer o quê? Dar entrevistas? Vender autografos? Bonequinhos das personagens dos jogos?

    Cumps

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